domingo, 8 de maio de 2016

19 DE AGOSTO DE 1572

O poder reivindicativo dos moradores da foz do Cávado não se quedou pela separação religiosa, muito menos pela passagem de lugar a freguesia independente. A luta continuou e procurou obter do poder real a sua independência tutelar da vizinha cidade de Barcelos a cujo termo pertencia.
Recordemos que no foral novo dado por D. Manuel I a Barcelos, em 1515, já os pescadores do lugar de Esposende e de Fão vêm mencionados e a eles era cobrado um imposto pelo pescado. Diz o referido documento:

“ E allem dos ditos direitos que se pagam na ditta villa e julgados sobreditos se ham de arrecadar pera Nos e Coroa de nossos Regnos no rio do Cavado que passa polla dita villa e per os lugares de Fãao e Esposende, e em outros quaesquer que se fazerem na marca e paragem em termo destes o direito dos pescadores, a saber, duas dizimas huma velha e outra que se chama nova pollo contracto dos ditos pescadores. E veem assi de cinquo huum. O qual direito de cinquo huum se pagara assi do pescado que se tomar no rio como do que vier per fooz do dito rio que seja tomado por pescadores...”

A vontade dos moradores de fazerem vila o lugar de Esposende não foi só sentida no reinado de D. Sebastião mas já no tempo de D. João III manifestaram esse desejo. De facto, no texto da petição feita a D. Sebastião diziam que “Já vosso avô, que está em glória, foi informado deste lugar, em tempo que não tão nobre como agora, nem estava tanto a risco de ser saqueado, como está...”. Mas, e é mais uma vez o documento que nos fala, “e sendo despachada a petição para se fazer a provisão, morreu o procurador do dito lugar, e per dera-se a dita petição…“. Mais uma vez é protelada a vontade dos esposendenses de quinhentos.
Já no reinado de D. Sebastião é assinada uma mercê em que separava o montante das sisas de Esposende das de Barcelos a fim daquelas serem usadas para a obra da igreja do lugar de Esposende mas somente em 19 de Agosto de 1572 era outorgada uma Carta Régia que para além de elevar este lugar à categoria de vila, separava-o de Barcelos e lhe dava um termo.

CARTA RÉGIA QUE ELEVOU ESPOSENDE A VILA


“ Dom Sebastião por Graça de Deus Rei de Portugal e dos Algarves d’aquém e d’além Mar, em África, Senhor da Guiné e da conquista, Navegação, comércio da Etiópia, Arábia, Pérsia e da Índia. Faço saber aos que esta carta virem que os moradores do lugar de Esposende, termo da vila de Barcelos me fizeram a petição de que o traslado é o seguinte: — Dizem os moradores do lugar de Esposende termo da vila de Barcelos terras e jurisdição do Duque de Bragança que no dito lugar há trezentos e setenta para quatrocentos vizinhos juntos e arruados, e muito nobre de casarias, gente rica, e abastada e a maior parte dela do serviço de Vossa Alteza, por seu porto de Mar, em que há setenta para oitenta navios grandes, e muitos pilotos e homens do Mar que de contínuo com eles servem a Vossa Alteza em o qual lugar por ser tão nobre tem vossa alteza alfândega, e oficiais dela e sendo tal não há nela escrivão nem tabelião, nem outro oficial de justiça para a haver de fazer aos moradores dele, salvo os da dita vila de Barcelos, que é duas léguas muito grandes do dito lugar; em cujo termo há passante de vinte mil fogos a que comodamente se não pode dar despacho por razão de todos estarem debaixo de uma só judiciatura, e por eles suplicantes serem homens do mar, e terem suas navegações, não podem ir à dita vila requerer suas justiças antes muitas vezes a deixaram perder, pelas quais já vosso avô que está em glória, foi informado deste lugar em tempo que não era tão nobre como agora nem estava tanto a perigo de ser saqueado como ora está por os muitos corsários do mar que facilmente o podem fazer sem contradição alguma por falta de justiça que nela reside para haver de constranger a gente com a presteza e penas que para tal caso é necessário ocorrer a outros muitos desaguisados que cada dia no dito lugar sucedem lhes tinha feito mercê de os fazer vila, e sendo despachada a petição para se fazer a provisão, morreu o procurador do dito lugar, e perdeu-se a dita petição e por que também vossa alteza informado do dito lugar ser tão grande e nobre, lhe fez mercê de o apartar sobre si nas repartições das sisas da dita vila de Barcelos; e assim lhe fez mercê da imposição para a igreja do dito lugar. — Pedem a vossa alteza que havendo respeito a tudo acima dito haja por bem fazer-lhe mercê de os fazer vila dando-lhes termo conveniente com que se possam socorrer e governar, por que desta maneira vossa alteza será melhor servido, e o povo menos vexado e oprimido e receberá mercê. — E visto seu requerimento antes de outro despacho, mandei ao Provedor da comarca e Procuradoria da vila de Viana Foz do Lima, que se informasse do conteúdo na dita petição e soubesse quantos vizinhos no dito lugar havia, e a qualidade deles e quantos navios tinha e a distância que havia do dito lugar à dita vila de Barcelos, e que fizesse dar vista da dita petição ao procurador do Duque de Bragança, meu muito amado e prezado sobrinho, cujo é o dito lugar, e que ouvisse acerca disto os oficiais da câmara da dita vila de Barcelos, e que de tudo o que olhasse e houvesse e outros dissessem; fizesse fazer autos, e me enviasse o traslado deles, autêntico e me escrevesse seu parecer acerca do que os moradores do dito lugar de Esposende pediam, ao que foi pelo dito Provedor satisfeito e me enviou os ditos autos e eu os mandei ver pelos desembargadores do Paço, que dele me darão informações e consta pelos ditos autos haver duas léguas grandes do dito lugar de Esposende à dita vila de Barcelos e haver nele trezentos e setenta vizinhos mareantes, e terem setenta e quatro navios de alto bordo, a que chamam Caravelas, e se mostra mais pelos ditos autos serem ouvidos sobre este caso os oficiais da câmara da dita vila de Barcelos, e requerem ao dito Procurador, que tomasse informação dos moradores do lugar de Fão e das freguesias conjuntas a Esposende, por que delas era o prejuízo fazer o rito lugar vila e que seria grande diminuição de Barcelos apartar-se, isentar-se dela Esposende e que no dito lugar havia muito poucas causas e negócios, e lhe bastava o juiz que tem com a justiça da dita vila e que não havia gente para se governar por andar sempre o mar e que fazendo-se vila era necessário fazerem-se des pesas para as quais o povo ao presente não era poderoso e assim viu a carta e informação do dito Provedor em que diz: Que seu parecer é, que o dito lugar se deve fazer vila por a muita vexação que os moradores dele recebem em irem requerer seus negócios de justiça à dita vila de Barcelos e onde as causas e demandas do termo eram tantas, que se não compadeciam por passar de dezoito mil vizinhos a que comodamente se não podia dar aviamento e que para mais justificação se devia tomar o parecer de Dom Pedro da Cunha do meu conselho e presidente da alçada que lá andava ao qual mandei mostrar os ditos autos, e a carta do dito Procurador e por seu assinado declarou, que pelo que tinha visto do dito lugar de Esposende, onde estivera com a alçada, lhe parecia por muitas razões, que eu lhe devia conceder mercê que me pedia, e o devia fazer vila s com tudo mandei que o Procurador que o Duque tem em minha corte houvesse vista da petição que os moradores do dito lugar sobre este caso me fizeram, e respondeu por sua parte o que fazia a bem de sua justiça o que tudo visto, havendo respeito as causas e razões alegadas e de legítimas sobre este caso visto hei por bem e me apraz de fazer vila o dito lugar de Esposende, e quero que daqui em diante para sempre se possa chamar e chame vila de Esposende, e a tiro e aparto de qualquer sujeição e superioridade, que a dita vila de Barcelos nele tem sem embargo de quaisquer privilégios e posse que em contrário haja por quanto por os ditos respeitos e por lhe fazer mercê o hei assim por bem, e lhe dou por termo distância de meia légua em circuito — de Esposende para a parte do norte até S. Bartolomeu do Mar, e daí direito a Vila-Chã. S. Cláudio e Gemeses, e daí até o rio Cávado, no qual limite de meia légua há seis freguesias que tem setecentos vizinhos, e esta mercê que assim faço a dita vila de Esposende não prejudicará em coisa alguma as doações do Duque nem do Alcaide Mór da Vila de Barcelos, e o dito Alcaide Mór terá na dita vila de Esposende os direitos que até agora tem. E mando aos meus desembargadores, corregedor, juízes, justiças, oficiais e pessoas a que o conhecimento disto pertencer que em tudo cumpram e guardem esta carta, como se nela contém a qual se registará no livro da chancelaria da comarca da vila de Viana Foz do Lima e no livro da câmara da dita vila de Barcelos e da dita vila de Esposende, e esta própria se terá no cartório dela em boa guarda a qual por firmeza disso lhe mandei passar por mim assinada e selada do meu selo de chumbo. Baltazar Ferraz a fez em Lisboa a dezanove dias do mês de Agosto. Ano do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil quinhentos setenta e dois. Fernão da Costa o fez escrever. El-Rei — Carta porque vossa alteza fez vila o lugar de Esposende. Miguel de Câmara — Lugar do selo de chumbo — Pagou seis mil réis em Lisboa 26 de Agosto de 1572. Lançou-se a conta a fls. 61. João Fernandes. Registado no livro a fls. 33. António Guiomar. Pagou conta a Simão Gonçalves Pinto. — Cumpra-se e registe-se. Manuel Martins. — Registada no livro dos registos das Provedorias da comarca de Viana Foz do Lima e chancelaria da dita comarca e onde fora declarada. Viana Foz do Lima 15 do mês de Novembro de 1572 anos. João de Sá Guimarães.

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