IX
A
CASA DAS MARINHAS
ESPOSENDE
UMA VISITA OBRIGATÓRIA
A
Casa das Marinhas (1954-57) corresponde àquilo que Viana de Lima designaria por
"o solar dos tempos modernos". Nela está expresso o equilíbrio,
sempre presente nas moradias que projecta, entre os conceitos de modernidade e
naqueles que se referem às construções de carácter tradicionalista.
No
primeiro piso o espaço é fluido. Há uma clara preocupação em fundir os diversos
espaços que, subdivididos pela presença de elementos móveis, vão diferenciar os
respectivos usos, em cozinha, estar e jantar. A zona de estar, de pé-direito duplo
com amplo envidraçado voltado ao mar, liga-se francamente ao piso superior.
Este
efeito é traduzido, no exterior, pela continuação da laje da cobertura e da parede
norte, em granito, que funciona, também, como protecção dos ventos. No lado oposto,
prolongando esse mesmo paramento para nascente, cria-se uma zona exterior.
Nesta
parede se inscreve um véu que reforça a presença de uma mesa nela adoçada.
O
espaço, recanto abrigado mais directamente ligado a natureza e contrastando com
a exposição a poente, funciona como local privilegiado para estadias e refeições
ao ar livre. Um corpo cilíndrico, elemento dinâmico resultante da reconversão
da ruína de um antigo moinho, funciona como entrada e acesso ao piso superior.
Ao
nível do segundo piso os espaços, exíguos, albergam os quartos e uma zona de
trabalho que se estende por uma varanda. O patamar de chegada da escada serve,
para nele se instalar uma cama. O quarto de casal usufrui de um vão que lhe permite
a ligação com o espaço de pé-direito-duplo. A abertura dos vãos faz-se em clara
relação entre os usos da habitação, as suas ligações com exterior e os pontos cardiais.
A norte praticamente não existem aberturas. A nascente as suas dimensões são
controladas de acordo com as funções a desempenhar pela zona de refeições. A
poente o vão, maior, é protegido pela continuação da cobertura.
O
jardim da casa Viana de Lima em Marinhas, Esposende, reflecte de modo explícito
o programa modernista emanado pela casa e toda uma espacialidade que puxa a sua
percepção e vivência para a ligação do corpo ao exterior, á paisagem e à fruição
do ar livre.
Discreto
no risco (mesma algo indefinido), usa afirmativamente a vista que passa por cima
dos muros, propositadamente baixos, e se alonga para poente, através dos campos,
guiando a olhar até aos pinhais, à praia e ao mar. Para nascente, por cima de
muros de pedra mais altos, vêem-se os montes que sobressaem escuros no céu. É o
velho programa da casa no jardim que parece paisagem, repetidamente
interpretado desde o paisagismo setecentista inglês, agora democratizado no
mais contido espaço moderno português.
O
lote pequeno, provavelmente destacado do topo poente de um campo rectangular,
estende-se como um rectângulo ao baixo, ao longo da estrada nacional,
A
casa posiciona-se num subtil pequeno alto, seguindo a posição do moinho
depurado; o conjunto edificado abre-se para a paisagem que entra no jardim e
faz neste sua possível continuação. O espaço próximo é pontuado por
afloramentos rochosos que lideram o carácter naturalista do exterior moderno.
Do lado norte, um portão abre um percurso numa calçada de seixo e pequenas
lajes (com um toque nipónico) que se desenvolve em curva larga adoçada ao suave
relevo até à entrada principal. Uma peça de pedra para recolher as águas
pluviais, por detrás do moinho, a nascente, consuma a intenção projetual de um
pequeno elemento de água, algo ameboide, muito ao gosto desse tempo.
(...)
Da
casa, pelas amplas portas envidraçadas que deslizam, junta-se concordantemente
o interior e o exterior, cumprindo um ponto alto do ideário modernista; a
nascente fazem-se refeições cá fora num local protegido do norte por uma parede
pontualmente fenestrada; para um lado e para outro, o olhar e o corpo passam
com facilidade, se calhar descalços, de dentro para fora, da sala para o prado,
para u sul, para o ar livre, para a paisagem.
(Câmara
Municipal de Esposende - Programa museológico da Casa das Marinhas)
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