sábado, 5 de abril de 2014

IX


A CASA DAS MARINHAS
ESPOSENDE
UMA VISITA OBRIGATÓRIA



A Casa das Marinhas (1954-57) corresponde àquilo que Viana de Lima designaria por "o solar dos tempos modernos". Nela está expresso o equilíbrio, sempre presente nas moradias que projecta, entre os conceitos de modernidade e naqueles que se referem às construções de carácter tradicionalista.
No primeiro piso o espaço é fluido. Há uma clara preocupação em fundir os diversos espaços que, subdivididos pela presença de elementos móveis, vão diferenciar os respectivos usos, em cozinha, estar e jantar. A zona de estar, de pé-direito duplo com amplo envidraçado voltado ao mar, liga-se francamente ao piso superior.
Este efeito é traduzido, no exterior, pela continuação da laje da cobertura e da parede norte, em granito, que funciona, também, como protecção dos ventos. No lado oposto, prolongando esse mesmo paramento para nascente, cria-se uma zona exterior.
Nesta parede se inscreve um véu que reforça a presença de uma mesa nela adoçada.

O espaço, recanto abrigado mais directamente ligado a natureza e contrastando com a exposição a poente, funciona como local privilegiado para estadias e refeições ao ar livre. Um corpo cilíndrico, elemento dinâmico resultante da reconversão da ruína de um antigo moinho, funciona como entrada e acesso ao piso superior.
Ao nível do segundo piso os espaços, exíguos, albergam os quartos e uma zona de trabalho que se estende por uma varanda. O patamar de chegada da escada serve, para nele se instalar uma cama. O quarto de casal usufrui de um vão que lhe permite a ligação com o espaço de pé-direito-duplo. A abertura dos vãos faz-se em clara relação entre os usos da habitação, as suas ligações com exterior e os pontos cardiais. A norte praticamente não existem aberturas. A nascente as suas dimensões são controladas de acordo com as funções a desempenhar pela zona de refeições. A poente o vão, maior, é protegido pela continuação da cobertura.
O jardim da casa Viana de Lima em Marinhas, Esposende, reflecte de modo explícito o programa modernista emanado pela casa e toda uma espacialidade que puxa a sua percepção e vivência para a ligação do corpo ao exterior, á paisagem e à fruição do ar livre.
Discreto no risco (mesma algo indefinido), usa afirmativamente a vista que passa por cima dos muros, propositadamente baixos, e se alonga para poente, através dos campos, guiando a olhar até aos pinhais, à praia e ao mar. Para nascente, por cima de muros de pedra mais altos, vêem-se os montes que sobressaem escuros no céu. É o velho programa da casa no jardim que parece paisagem, repetidamente interpretado desde o paisagismo setecentista inglês, agora democratizado no mais contido espaço moderno português.
O lote pequeno, provavelmente destacado do topo poente de um campo rectangular, estende-se como um rectângulo ao baixo, ao longo da estrada nacional,
A casa posiciona-se num subtil pequeno alto, seguindo a posição do moinho depurado; o conjunto edificado abre-se para a paisagem que entra no jardim e faz neste sua possível continuação. O espaço próximo é pontuado por afloramentos rochosos que lideram o carácter naturalista do exterior moderno. Do lado norte, um portão abre um percurso numa calçada de seixo e pequenas lajes (com um toque nipónico) que se desenvolve em curva larga adoçada ao suave relevo até à entrada principal. Uma peça de pedra para recolher as águas pluviais, por detrás do moinho, a nascente, consuma a intenção projetual de um pequeno elemento de água, algo ameboide, muito ao gosto desse tempo.
(...)
Da casa, pelas amplas portas envidraçadas que deslizam, junta-se concordantemente o interior e o exterior, cumprindo um ponto alto do ideário modernista; a nascente fazem-se refeições cá fora num local protegido do norte por uma parede pontualmente fenestrada; para um lado e para outro, o olhar e o corpo passam com facilidade, se calhar descalços, de dentro para fora, da sala para o prado, para u sul, para o ar livre, para a paisagem.


(Câmara Municipal de Esposende - Programa museológico da Casa das Marinhas)

sexta-feira, 4 de abril de 2014

VIII
QUINTA DE PREGAIS
FORJÃES – ESPOSENDE





A Quinta de Pregais era, ainda em meados deste século, uma extensa e florescente propriedade agrícola. Com a morte do seu proprietário, o dono da Quinta de Curvos, foram os Campos de cultivo e área de monte retalhados pelos herdeiros enquanto o solar avolumava o já decrépito estado de degradação. Só anos mais tarde, na década de 60, a situação se inverteu, quando o Sr. Soares Teixeira, a comprou e iniciou o seu restauro.
Se atentarmos numa inscrição cravada na face exterior do muro que defende o solar pelo lado nascente, a Quinta de Pregais remonta à fundação da nacionalidade, já que teria sido um tal Guterres - para alguns o fundador do mosteiro de Carvoeiro - quem teria erguido, no ano de 1100, uma torre que viria a ruir muito depois, por volta de 1600.
Se a quinta foi pertença do fundador do mosteiro de Carvoeiro, taxativamente não o podemos afiançar, mas podemos afirmar que documentalmente tal propriedade ia existia no séc. XIII, pois vem descrita e referida como terra arada nas Inquirições que o rei D. Dinis mandou efectuar: “item e na freguezia de sancta marinha de Frogaes no logar que chamam/Svariz soya y entar o porteiro da terra e ora no leixam y entrar/Rodriga Afonsso e Martim Sardinha porque eu mando da pane d’ El / Rey que entre y o porteiro da terra e no logar que chamam Pedragaes”(A.N.T.T., 0166, Inq. D. Dinis, 1.3,Casa Forte, fls.7).
Que a quinta era uma propriedade senhorial, também temos disso a comprovação, pois na mesma altura ela é descrita como Sendo um paço: “item achey no livro de loham Cesar e no rol de loham Dominguiz que achara que soya entrar o porteyro/no paaço de Pedregaes y o moordomomo d’ El Rey na aldea e asy mandarom que entrasse hy” (A.N.T.T.o275, Inq. D. Dinis, 1.8, Casa Forte, fls.26v).
Falta de comprovação material e documental há quanto à existência de uma torre, ruída na era de 1600 consoante o diz a inscrição da cartela cravada na parede exterior da quinta: “Pedra da antiga e privilegiada torre feita por D. Guterre no ano de 1100 e caída no ano de 1600”. No entanto e tratando-se de uma quinta honrada, isto é, de uma casa senhorial, um paço, que até se dava ao luxo de impedir a fiscalização dos representantes locais do rei, é bem possível que tal torre existisse. Outras conseguiram chegar até a actualidade, em propriedades semelhantes documentadas em várias terras do Entre-Douro-e-Minho. Menos sustentável será a tradição que aponta o nascimento na quinta de Frei Gonçalo Velho - da estirpe dos Velhos de Viana do Castelo – descobridor da Terra Alta na costa africana e mais visionária será ainda a notícia de aqui, esporadicamente, ter pernoitado Nuno Álvares Pereira.
Independentemente da sua antiguidade, o actual edifício é uma construção em L, conjunto que denota uma filiação setecentista bem expressa, aliás, na fachada da capela que lhe está acoplada pelo lado norte. Se os elementos arquitectónicos não fossem tão explícitos, haveria ainda a provisão passada pelo Arcebispo de Braga em 1756 a Dom Diogo de Jesus Maria (clérigo) e seu irmão Antonio José Maciel para que pudessem erigir e edificar, de novo, uma capela a Nossa Senhora do Rosário na sua Quinta de Pregais: “fazer huma capella junto a Suas cazas e quinta de Pregais freguezia de Santa Marinha para nella ouvirem missa celebrarem os ofícios divinos em honra e glória de Deus e dos seus santos e ainda fazerem melhoramentos ao vínculo de Morgado que instituo elle Antonio José Maciel e seu irmão da dita quinta e outros mais bens livres que elle Dom Diogo de Jesus Maria quer aplicar para ficar unidos todos a ella dita Capella". Concluída a obra, a fábrica da capela ficava com os seguintes bens: o Campo da Cortinha de Dentro, o Campo da Cortinha do Valo e o Campo do Pombal, todos eles situados dentro da “dita quinta”. A estes terrenos juntavam-se ainda o campo que haviam comprado a Roque Ferros, um souto de carvalhos e um outro de sobreiros, todos eles situados em redor da Coutada da Mata (ADB, RG, 147, fls. 208-210).
Do lado de dentro, estende-se um amplo terreiro para o qual dá a escadaria principal, adossada à parede e a partir da qual se ascende a uma pequena varanda, lajeada e coberta com um telhado sustentado por uma colunata com capitéis de tipo dórico. Sobre o portão principal, um brasão com as armas dos Carneiros de Vila do Conde, família que, em 1916, vendeu casa conjuntamente com a parte agrícola e de monte a Antonio Rodrigues Alves de Faria.
Em termos arquitectónicos a casa da Quinta é uma construção em L, com a fachada principal voltada a Nascente. Está rebocada, pintada de branco e possui a dois pisos, sendo o segundo mais vocacionado para habitação. A partir do terreiro, existe, no ângulo interior do edifício, o acesso a este andar, através de uma escada de granito, de um só lance, com corrimão lavrado, que desemboca num balcão avançado e rusticado, aberto com dois arcos bem lançados no piso térreo. Este balcão, sóbrio, adossado a fachada nascente, é abrigado por um telhado assente sobre elegantes colunas circulares e uma pilastra almofadada.
Salienta-se aqui a porta principal, com austera moldura em granito, de recorte classissizante e madeira almofadada cujo talhe denota o gosto setecentista.
A fachada da casa voltada a poente e sóbria, com pequenos postigos rectangulares ao nível da loja, aberta com três varandas e duas janelas no segundo piso.
Estas, com molduras graníticas simples, estão encimadas por beirais ondulados, de granito destacado. Ainda nas traseiras, abre-se a entrada para a cozinha, com um pequeno corpo destacado, de cércea mais baixa, rusticado, com acesso ao segundo piso por uma escada de um só lance.
Como casa de lavoura que era, a quinta possuía casas destinadas aos caseiros, separadas por uma parede que delimitava o espaço do terreiro pelo lado meridional e uma eira cimentada, que acompanha um antigo varandao, muito alterado e que não confere grande dignidade ao conjunto. Pelo contrário, o arco abatido sob um pequeno solário no prolongamento do alçado sul que, do terreiro, dá acesso as traseiras do edifício, conjuga-se com a arquitectura da casa. As antigas casas dos caseiros foram, por sua vez, substituídas por outras de confecção mais recente e que perderam qualquer relação com o primitivo conjunto setecentista.
Orientado no sentido nascente-sul, todo o conjunto está fechado por um alto muro ameado no qual se abre um portão armoriado coroado pela pedra de armas dos Barbosas (Fonseca, 1936, 170). Transposto o portão abre-se um amplo terreiro pontuado por tufos de hortênsias e japoneiras e a modos que quase esquecida, a sólida pia trilobada de um fontanário que não existe. Ainda junto a parede da casa ergue-se um cruzeiro num pódio inserido entre duas portas da loja, que ostenta uma cruz fasciculada, assente num plinto com volutas datado de 14 de Junho de 1975, numa clara tentativa decorativa de sugerir uma ancestralidade oitocentista que a data não apoia.
Com um exterior enobrecido pela pedra de armas dos Barbosas ladeada por volutas e cuminada por uma esfera onde assenta uma cruz, esta construção oferece a apreciação exterior um muro alto, rebocado, pontuado com ameias de uma água e sineira assente sobre plinto com volutas junto à fachada da capela. A sineira granítica, rematada por frontão curvo interrompido, está coroada com um remate de forma globular. Nesta mesma parede ameada sobressai a já mencionada cartela - Pedra da antiga e privilegiada torre feita por D. Guterre no ano de 1100 e caída no ano de 16oo - e um modilhão em forma de cara humana, resquício de uma construção românica que remonta à primeira dinastia.
(Almeida, Brochado de – Santa Marinha de Forjães, 2001)
VII
CASA DOS SARAIVAS
APÚLIA - ESPOSENDE

A Casa dos Saraivas pertence, actualmente, ao Dr. José Gomes Hipólito.
É um edifício disposto em L com pátio, no qual se entra através de uma ampla porta carrária.
A Carta de Armas do brasão que ostenta na sua fachada, foi outorgada a João Veloso de Miranda que morava na Quinta da Torre, em Bassar - Barqueiros, no ano de 1736. O pergaminho, de belíssimo recorte pictórico, é propriedade do Ex.mo Sr. Eng.º Azevedo que, amavelmente o colocou a nossa disposição para estudo. Refira-se que o Sr. Eng.º Azevedo é o actual proprietário da Quinta de Bassar.
Este documento foi mandado passar por El-Rei D. João V tendo João Vellozo declarado que descendia "…e vinha de geração e linhagem dos Mirandas, Ferreiras, Vellozos e Affonsecas, e que as suas armas lhe pertenciam de Direito..." (Artur Vaz Osório da Nóbrega – Pedras de Armas e Armas Tumulares do Distrito de Braga, vol. VII). Este João Veloso de Miranda passou assim a ter o estatuto de fidalguia.
Era filho de Luiz Vellozo de Miranda Ferreira e de sua mulher D. Teodora Luiza de Miranda, descendente dos Matos e Godinhos. Os seus ascendentes eram Cavaleiros do Hábito de Cristo e Secretários da Mesa da Consciência, sendo todos fidalgos, isto por parte do Pai. Da parte da Mãe, os seus ascendentes eram os Matos Godinhos, Oficiais da Justiça, tendo servido os cargos mais nobres.
Curiosamente na Carta de Brasão, diz-se que "...em todos os seus ascendentes nao houve raça de judeu, mouro ou mulato".
A leitura do Brasão é a seguinte: “Escudo esquartelado, no primeiro quartel as armas dos Mirandas, em campo de ouro uma aspa vermelha entre quatro flores-de-lis verdes, no segundo as dos Ferreiras, em campo vermelho entre quatro barras de ouro, no terceiro os dos Vellozos, em Campo vermelho uma torre de prata sobre um Campo verde e ao pé da porta um Açor com uma perdiz nas unhas e sobre cada castelo uma flor-de-lis de ouro, no quarto as dos Affonsecas, em campo de ouro cinco estrelas vermelhas em aspa. Elmo de prata aberto guarnecido a ouro. Paquife dos metais e cores das armas. Timbre, uns penachos de ouro, entre uma flor-de-lis de ouro e por diferença uma brica de prata e um trifólio preto.
Leitura do Escudo dos Vellozo Miranda:
Escudo e Elmo com timbre mutilado, assentes numa cartela decorativa.
Composição esquartelada
Leitura:
I - Miranda
II - Ferreira
III - Veloso
IV - Fonseca
Diferença: Uma brica com um trifólio. Timbre de Miranda mutilado.

Um outro filho de Luiz Vellozo de Miranda e de D. Theodora Luiza, de nome Raphael Joseph de Vellozo de Miranda Mattos, casou em 5 de Fevereiro de 1736, com Catharina Ribeiro de Villas Boas, natural de Criás, filha de João Manuel da Branca e de Paschoa Ribeira. Passou a viver em Criás e é assim que a sua casa passa a poder ostentar o Brasão de Armas da Família. Foi herdeiro desta casa o P.° José Villas Boas Ribeiro que recebeu Ordens Sacerdotais em 28 de Agosto de 1816.
(NEIVA, Manuel Albino Penteado - Apúlia na História e na Tradição, 2000)


VI

QUINTA DO FILIPE OU QUINTA VELHA
S. PAIO DE ANTAS
ESPOSENDE


Não se sabe ao cerro a origem deste solar. Segundo o testemunho dos seus proprietários actuais - a família de Manuel Martins Viana - existe um pergaminho (que não consegui encontrar) em que D. Sebastião concedia aos proprietários desta quinta, certos privilégios, o que comprovaria a antiguidade desta família. Os documentos de que dispomos para identificar este solar são sobretudo três: O brasão de armas incrustado que se encontra no portão do antigo solar. em frente das suas ruínas, o testamento de um dos seus mais remotos antepassados, Manuel da Cunha Leão Pinheiro, de 9 de Outubro de 1739 e a inscrição que assinala a morte de D. Diogo da Cunha naquele local cm 1744.
Todos estes documentos, se nada nos dizem das origens desta Casa, assinalam-nos a sua ligação com os Cunhas de Viana do Castelo, de que existira um ramo na Casa de Belinho.
Esta quinta é conhecida também por "Quinta do Filipe” por ter pertencido a Filipe da Cunha, filho de Manuel da Cunha Leão Pinheiro ou então por “Quinta Velha”, pelo grande estado de abandono em que se encontrava já nos finais do século XIX.
A imagem de Nossa Senhora com o Menino foi mandada colocar sobre o portão em 1929 pelo então proprietário da quinta, Francisco Martins Viana, avô dos actuais proprietários da quinta, em cumprimento de um voto; tem a invocação de Senhora da Cabeça, por reproduzir a imagem da mesma invocação que se venera na freguesia de Freixieiro de Soutelo, no concelho de Viana do Castelo.
As armas do brasão são semelhantes à da Casa dos Cunhas, de Belinho na composição aparecem os Lobatos em vez dos Sottomayor, o seu material é de granito e foi elaborado no século XVIII. O escudo, assente numa cartela decorativa. Coronel de nobreza. A sua composição é esquartelada e a sua leitura é a seguinte: I - Cunha; II - Maciel; III – Lobato (os lobos da bordadura somente); IV - Faria.
Manuel da Cunha Leão Pinheiro, filho do capitão João Pinheiro, era natural de Viana do Castelo, descendente da família dos Cunhas; no seu testamento datado de 9 de Agosto de 1739, ordena que o seu corpo “seja sepultado na capela-mor de Nossa Senhora da Misericórdia da Vila de Viana, onde está a sepultura dos Cunhas meus parentes e passados, a qual mostrarão os meus primos Francisco da Rocha Lobo e António da Cunha". Era casado com D. Vitória do Rego, natural das Neves, onde possuía uma quinta.
Nesse mesmo testamento, Manuel da Cunha Leão Pinheiro, nomeia como administrador desta capela e deste morgadio, seu filho Filipe da Cunha. É assim que esta quinta passa a designar-se por Quinta do Filipe.

(Adélio Torres Neiva – S. Paio de Antas: Sua História – Sua Gente, Antas, 2000)